terça-feira, 2 de março de 2010

Educação

Lições da revolução educacional coreana
Abram Szajman*

Em três décadas, número de alunos no ensino superior multiplicou-se 12 vezes na Coréia
Há um país na Ásia que não é grande e populoso como a China ou a Índia, mas cujo êxito econômico merece ser analisado com mais atenção por países como o Brasil, que vagam à deriva em busca de um modelo que lhes assegure o tão sonhado crescimento sustentado. Trata-se da República da Coréia, ou Coréia do Sul, que nasce em 1945, após décadas de ocupação e exploração pelo Império do Japão. Ao final da Segunda Guerra Mundial, sob a proteção soviética, instala-se um regime socialista na parte norte da península da Coréia, que vai à guerra contra o sul, respaldado e armado pelos Estados Unidos. A primeira guerra "quente" das muitas que ocorreram durante a Guerra Fria termina com o armistício de 1953, consagrando a divisão entre a Coréia do Norte e a do Sul, que surgem, dessa forma, já extenuadas economicamente.
É então que começa a trajetória original do capitalismo sul-coreano rumo à industrialização e à condição de líder, entre os países emergentes, na exportação de produtos com alto valor agregado. O primeiro passo foi a implantação da reforma agrária, que na mesma época estava sendo feita no Japão por imposição da ocupação militar norte-americana. A distribuição da terra, em ambos os países, acaba com o poder da aristocracia feudal latifundiária, lançando as bases de um mercado interno forte. A seguir, vem a etapa mais importante: a revolução educacional, favorecida pelo lugar de destaque que o estudo tem nas religiões e filosofias predominantes no norte da Ásia, como o budismo, o confucionismo e o taoísmo. A educação pública foi universalizada e os jovens em idade escolar permanecem estudando durante 12 ou mais anos, em período integral, sendo vedado o trabalho de qualquer tipo aos menores de idade. Como complemento, um serviço militar compulsório de três anos possibilita aos homens ingressar nas universidades mais maduros e aptos a tomar decisões.
A estrutura universitária da Coréia do Sul, pautada pela disciplina e por rígidos padrões de cobrança, acabou por viabilizar, no curto espaço de uma geração, a formação de uma população educada e preparada para desfrutar dos benefícios da tecnologia. A busca permanente do conhecimento levou um grande número de estudantes coreanos a continuar os estudos técnicos e de especialização nas melhores universidades dos EUA e Europa. Finalmente, o sistema de estruturação empresarial primou pela cópia do modelo japonês, baseado em grandes conglomerados, que lidam com todos os aspectos de um empreendimento, tais como financiamento, produção e distribuição. A Hyundai, a exemplo da japonesa Mitsubishi, é uma estrutura econômica verticalizada, que compreende desde banco até uma trading, passando pela indústria, que não é só automobilística, mas abrange estaleiros e siderúrgicas. O Estado coreano apóia esses conglomerados no período de sua consolidação, inclusive por meio de barreiras protecionistas, durante o intenso processo de industrialização. Essas barreiras impediam apenas a entrada de produtos acabados, ao passo que as parcerias técnicas e o aporte de capital eram estimulados, como ocorreu entre a indústria automobilística coreana e as montadoras americanas. Em 2000, as exportações brasileiras totalizavam US$ 55 bi, enquanto a pequena Coréia somava US$ 155 bi, quase o triplo. A Coréia especializou-se, nas décadas de 60 e 70, na produção de bens de capital e passou a exportar, ao mesmo tempo, para os diferentes pontos do planeta, sem qualquer diferenciação ideológica, produtos como aço, navios, veículos novos e usados - e serviços: construiu portos na região dos Emirados Árabes e estradas na Mongólia. Por sofrer de uma escassez crônica de matérias-primas e alimentos, a República da Coréia precisa exportar 50% de tudo o que produz, de forma a acumular as divisas necessárias para fazer frente às necessidades de importação, vitais para alimentar a população. O que diferencia hoje a Coréia do Sul de outros países de desenvolvimento industrial tardio, como o Brasil, é que ela aprendeu a valorizar a pesquisa privada e, não por acaso, tornou-se referência mundial em tecnologia de celulares e televisão a plasma - a televisão digital. Enquanto isso, entre nós, gasta-se menos que 1% do PIB em pesquisa científica e tecnológica.
Creio que entre as lições da experiência coreana que podemos aproveitar destaca-se a melhoria progressiva do perfil da pauta de exportações, com ênfase para os produtos de maior valor agregado. Isso só será possível na razão direta de um considerável aporte de recursos, em especial do setor privado, em ciência e tecnologia. Também é importante destacar o elevado padrão de vida decorrente de um bom nível salarial dos trabalhadores e da preocupação de distribuir terras, fatores que acabaram por mitigar as desigualdades.
A educação selou um pacto do povo coreano com a democracia e o futuro, além de contribuir para o aumento da mobilidade social, por meio da expansão da classe média. No confronto com a cultura estrangeira importada, houve uma redescoberta dos valores tradicionais, proporcionando uma nova síntese da cultura nacional. Em 1970, apenas pouco mais de 200 mil alunos cursavam o ensino superior na Coréia do Sul, o equivalente a 0,62% de uma população de 30 milhões de habitantes. Em 2003, de uma população de 48 milhões de pessoas, mais de 3,5 milhões ou 7,4% cursavam alguma faculdade no país. Também no ano passado 162 mil estudantes sul-coreanos faziam graduação tecnológica, mestrado e doutorado nos Estados Unidos, no Japão e na Inglaterra.
Enquanto isso, no Brasil, havia cerca de 425 mil alunos no ensino superior em 1970, que representavam 0,45% da população. Em 2003 esse percentual havia sido ampliado em apenas 3,5 vezes, enquanto o salto na Coréia do Sul foi de 12 vezes, em idêntico espaço de tempo. Como resultado, no ano 2000 as exportações brasileiras totalizavam US$ 55 bilhões, enquanto a diminuta Coréia somava US$ 155 bilhões, quase o triplo. A educação, como se pode ver, faz toda a diferença.
* Abram Szajman é empresário e presidente da Fecomércio-SP - Federação do Comércio do Estado de São Paulo.
Fonte: Valor Econômico (V. Online), 01/11/04 - S. Paulo, SP.


Brasil avança no ensino superior, mas ainda fica na lanterna do continente


Estudo do Ipea mostra aumento de 123% na frequência de cursos ao longo da última década
O Brasil avançou ao proporcionar maior acesso ao ensino superior à sua população ao longo da última década. No entanto, o país ainda continua na última colocação da América Latina no indicador. Essas são as conclusões do estudo Juventude e Políticas Sociais no Brasil, divulgado na terça-feira (19/1) pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).
De acordo como trabalho, em 2007, 13,2% da população dos jovens (entre 18 e 24 anos) no país freqüentavam a universidade. Embora o número ainda esteja abaixo das metas estabelecidas pelo Plano Nacional de Educação (PNE) – que prevê estender esse percentual para 30% até 2011 – ele representa um aumento de 123% sobre o resultado que era apurado em1996, de 5,8%.
Apesar do avanço na inclusão educacional, o Brasil ainda não conseguiu sair da "lanterna" do continente. O estudo do Ipea mostra que o Brasil tinha 213 estudantes para cada 10 mil habitantes em 2007. Trata-se de um número inferior ao de países como a Argentina – líder da região, com 531 – e mesmo da Venezuela (389) e da Bolívia (347).
"Claro que quanto maior o nível de qualificação dos trabalhadores, maior é a produtividade e o desenvolvimento do país", diz a economista Priscilla Matias Flori. Segundo ela, as dúvidas que existem são se o ensino superior em oferta hoje é eficiente e capacita os jovens a fazer a diferença no progresso do Brasil. "Considero que a resposta para essas perguntas é a mesma: não. Distribuir diplomas para que o percentual aumente não é a solução", completa.
Avanço desigual
Segundo o estudo, a principal responsável pelo aumento no número de vagas foi a política encampada pelo Ministério da Educação de incentivar a expansão das matrículas no setor privado através de bolsas e financiamentos.
No entanto, "talvez o que mais preocupe seja a qualidade desses cursos superiores, e não a quantidade de pessoas que estão neles. O que vemos, infelizmente, é uma proliferação de universidades particulares que nada acrescentam para o conhecimento do aluno. Esse é um fator que pode acarretar um impacto negativo no mercado de trabalho e, consequentemente, na competitividade do Brasil", analisa Priscilla. O avanço também se dá às custas da desigualdade regional.
No Sudeste, Sul e Centro-Oeste, o indicador de jovens que freqüentam a universidade estava na casa de 16%. Já no Nordeste e no Norte ele era respectivamente de 7,5% e de 9,0%. Também há uma forte diferença quando se leva em conta o local de habitação dos estudantes.


Fonte: Brasil Econômico, Marcelo Cabral, 20/1/10.